quarta-feira, 3 de julho de 2013

Remember Me

Na Paris futurística de 2084, uma garota precisa lutar por uma causa que ela mesma não sabe do que se trata. Sem memória, Nilin mal conhece a si mesma e, ainda sim, ajuda um desconhecido que sabe do seu passado e tem plena noção de como recuperar a sua memória roubada. Ao mesmo tempo, vai tentar impedir uma guerra civil que está prestes a estourar. Este é Remember Me.

Passado desconhecido

 Nillin não sabe seu nome, de onde veio e nem porque estava encarcerada em uma das prisões mais severas de Paris. Assim como o jogador, ela vai aprendendo aos poucos sobre si mesma, escutando os conselhos de Edge, figura misteriosa que servirá de guia para o restante da aventura. Tudo flui muito bem, e aos poucos o tutorial do game vai lhe ensinando as principais ferramentas que fizeram da personagem, a mais temida das caçadoras de memória que se tem conhecimento.

O problema é que essa alcunha só serve para descrever uma pessoa que não existe mais. A nova Nilin é insegura de suas habilidades e vai evoluindo de acordo com o andamento do jogo. E fica difícil não pensar em sua versão anterior, se ela se preocupava da mesma forma que se preocupa agora, se o remorso que pesa em sua consciência é fruto dessa lavagem cerebral ou se a garota realmente se importava com as complicações morais de todos os seus atos. A trama do jogo peca em desenvolver um pouquinho mais desse aspecto da vida dela, mesmo que para apenas uma forma de comparação e uma melhor aceitação da personagem com o jogador.

A megacorporação Memorize, detentora da patente e distribuição do implante cerebral conhecido por Sensation Engine (Sensen), criou uma nova forma das pessoas lidarem com a dor. Com posse de um Sensen, é possível simplesmente extrair as memórias ruins, deixando a impressão de que tal fato nunca tivesse acontecido. Mas o caminho inverso também era possível, e inserir memórias falsas, manipulando a mente das pessoas para fins diversos era uma realidade. Nilin era conhecida como a melhor manipuladora de memórias e sua história envolve até mesmo assassinatos graças a essa habilidade.

O tom europeu da aventura difere bastante do clássico blockbuster americano. A história de ação se desenvolve de forma bem mais lenta, e em termos de mecânica de jogo, se foca em explicar, isoladamente, cada um dos aspectos principais de Remember Me. A exploração, com momentos de parkour ao estilo Uncharted, o combate contra múltiplos oponentes, a ferramenta de personalização de combos - um dos focos da sua divulgação -, e os remixes de memória, ponto alto do jogo. Nada daquela ação de tirar o fôlego do jogador de cara, mas mantém o seu próprio ritmo, seguindo uma linha mais cult, o que dá uma cara própria ao jogo.

Remember Me reserva boas surpresas em termos de história e narrativa, mas às vezes peca ao entregá-las. Grande parte disso em decorrência dos remixes de memória, cuja a ação se desenvolve em tempo real e às vezes falta uma introdução ao momento. A entrega da informação é excelente, mas o preparo essencial para o recebimento da mesma é um grande fardo para o jogo. Dá a impressão de ser algo proposital, devido à importância do conteúdo a ser revelado, mas a preparação não é suficiente, daí as coisas ficam meio jogadas e demora até que a gente realmente se importe com algo que foi mostrado.

Seja um DJ de memórias

 Remixar memórias é divertido, mas um tanto limitado. Em certos momentos do jogo, somos obrigados a hackear a mente de algumas pessoas e alterar suas lembranças de modo a fazê-los acreditar que determinado fato nunca existiu, ou existiu de forma diferente.

Alterando pequenos detalhes de cada memória, somos capazes de desencadear um novo rumo para a mesma, o que pode influenciar de diversas maneiras a sua conclusão. Apesar de que exista apenas uma forma correta, às vezes é interessante ir além e assistir a todas as possíveis variações do hacking. Sei que tem uma das fases que rende até um troféu por errar propositalmente o desfecho.

Não há tanta liberdade para a manipulação quanto o título sugere, limitando o jogador a situações pré-determinadas pelo jogo. O glitch na tela indica os itens que podem ser alterados, apesar de que nem sempre eles precisam de retoques. O maior problema aqui é a obtenção do resultado correto através da pura e simples tentativa e erro. Não há estratégia e nem punição para as inúmeras chances que você pode vir a ter para alcançar o sucesso.

Descendo a porrada

 Nilin não é mesquinha na distribuição de socos e chutes. Tem para todo mundo e os combos até que variam bastante. Ao contrário dos inúmeros hack'n slashes que existem por aí, ele não facilita aos 'button mashers' que apenas apertam botões a esmo, focando em uma maior precisão caso o intuito seja extrair o máximo de força dos seus Pressens.

Os ataques são divididos em quatro tipos de Pressens: força, recuperação, resfriamento e links. Cada um representado por uma cor, com variações para socos e chutes (botões diferentes, no caso do PS3, quadrado e triângulo, respectivamente). Para utilizá-los, é preciso montá-los em cadeias de combos pré-determinados pelo jogo, que já avisa de antemão que o primeiro golpe de cada lista não pode ser modificado.

A coisa funciona assim: você escolhe o tipo de golpe que quer para o combo, e a cada vez que o utiliza, ganha os bônus intrínsecos às suas propriedades naturais. Por exemplo,você tem uma cadeia de três golpes (sem contar o primeiro), e resolve montá-los da seguinte maneira: ataque normal - ataque de recuperação - ataque de resfriamento - ataque de força. Na hora de executar o combo, cada um dos tipos de ataque vai exercer a sua função primordial lhe concendendo os respectivos bônus por atributo.

Aí entra um pouco a sua forma de pensar o combate, se preza pela sua vida ou por ataques mais poderosos. Os do tipo resfriamento servem para a reutilização mais rápida de seus ataques especiais, enquanto os do tipo link aumentam a força da habilidade do Pressen anterior.

Fato é que o combate funciona bem contra múltiplos personagens, forçando o jogador a esquivar-se constantemente - e se realizado no tempo certo, possibilita a continuação do combo - algo muito parecido com o tipo de luta visto nos novos jogos do Batman. A parte negativa é que as lutas são meio frias, os golpes não são 'pesados' o suficiente e às vezes, pouco importam se acertam ou não.

Impossível não comparar a ideia da personalização dos combos de Remember Me com a mecânica encontrada em God Hand, outro título da Capcom, desenvolvido pelo extinto Clover Studio. Só que na aventura maluca de Gene, era preciso, além de escolher golpes fortes o suficiente para deixar seu personagem mais útil, uma forma correta de encaixá-los de modo a funcionarem de forma mais fluente. A ideia não é abandonada por completo em Remember Me, mas é pouco explorada e muitas vezes deixada um pouco de lado. Aí encontramos golpes que nitidamente serviriam como finalizadores, no meio de cadeias de combos sem nenhum sentido aparente. Basta que pensemos em quais atributos desejamos para o combo que está tudo bem.

O tempo do combate também incomoda. A resposta do inimigo ao seu ataque só existe caso seja o de um chefe de área (que são poucos). Inimigos comuns sucumbem aos combos de forma ininterrupta, mesmo após o término de um e início de outro, com uma pausa nítida entre os combos. O que é mais estranho é que mesmo essa pausa entre uma sequência e outra é pouco sentida pelo jogador, mas não de uma forma positiva, mas como se tivesse sido deixada de lado, um erro de programação.

Uma das lutas que eu mais esperava, mas que se tornou uma decepção sem tamanho, foi aquela mostrada no trailer contra o grandalhão Kid X-Mas, em um ringue, tipo Vale-Tudo. Tudo muito bonito e à altura do espetáculo, mas a pancadaria acontece em um momento muito cedo do jogo, sem que você tenha metade dos golpes realmente divertidos de Nilin. E a luta é rápida - e meio que o padrão se repete com todos os chefes, com exceção de um - e um tanto quanto sem graça, infelizmente.

Apertando o L2, acionamos uma grade de poderes especiais. Esses poderes demandam o acúmulo de uma energia específica, armazenada à medida que você surra capangas pelo cenário. Os poderes são particularmente úteis, e não possuem quaisquer tipos de restrições. Quer dizer, após o uso, é preciso esperar um certo tempo para reutilizá-los, mas é para isso que servem os Pressens de resfriamento, acelerando todo esse processo.

Explorando cenários

 Se tem algo que Remember Me precisa se gabar é com seu visual. A retratação futurista de Paris, primorosa e também com seus momentos decadentes, envolve o jogador de uma maneira bastante parecida com o que vimos em Enslaved, da Ninja Theory. Mesmo os indicativos de caminho para o cenário do jogo são tão bem disfarçados que dariam inveja aos constantes 'brilhinhos' de Uncharted e similares.

Todo o visual da cidade é mesclado entre o físico e o holográfico. O futuro visto em De Volta para o Futuro 2 se tornou realidade em Paris e diversas vezes temos nossa atenção desviada por uma sinalização mais colorida de um telão gigantesco. E tudo devidamente localizado para o nosso português, diga-se de passagem. Ao menos os hologramas.

A exploração dentro da Paris de 2084 acontece sem muitos problemas. Se não bastassem os indicativos de caminho espalhados pelas partes de escalada/parkour, a limitação imposta pelas paredes invisíveis deixa as coisas um tanto limitadas. Não chega a atrapalhar a experiência, pois nunca foi a proposta do game ser algo tão gigantesco, mas torna-se um pouco repetitivo, principalmente após encontrarmos todos os segredos do cenários, sob a forma de kits de upgrade de vida e barra de ataques especiais.

Os quebra-cabeças de cenário, envolvendo o traslado de um lugar a outro via muros, guindastes e saltos mirabolantes são devidamente roteirizados de forma linear, mas também trazem um pouquinho de dificuldade em momentos que requerem a descoberta de senhas ou similares. Durante a exploração você consegue reviver memórias de certas vítimas, e, eventualmente, precisa hackear os equipamentos eletrônicos usados por essas memórias para seguir adiante.

De vez em quando, alguns bugs surgem para atrapalhar o seu caminho, e não como parte do jogo. Momentos em que plataformas deveriam aparecer para continuarmos um certo trajeto que não aparecem, nos obrigando a morrer e recomeçar o trecho de forma que a sequência dê continuidade como deveria. foi algo bem chato e não aconteceu só uma vez.

Remember Me fez bem em aparecer agora. Uma nova franquia nas mãos da Capcom em um mundo cheio de continuações. Peca em alguns aspectos importantíssimos, mas não ao ponto de transformar a experiência em um completo desastre. Sem dúvida vale uma passadinha, e sem dúvida, a torcida por uma continuação.


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